sábado, 14 de abril de 2012

O aniversário de cem anos do futebol

A torcida chegou na Vila Belmiro, entre vaias aos visitantes e gritos de apoio ao time da casa, a festa é linda. Bandeiras, sinalizadores, tudo pronto para que comece o maior espetáculo da Terra.

E o jogo começa.

Araken e Feitiço, no centro do campo, dão a saída. Tocam a bola para Tite que, saindo para o ataque, acha Del Vecchio. Um passe para Pepe do lado esquerdo que, magistralmente inverte para a ponta direita. Dorval, num tapa de primeira acha Mengálvio que começa o jogo com Zito.

Zito, o capitão, para a bola, vê Gilmar concentrado, dá uma bronca no time e diz já são trinta segundos sem fazer gol e sem jogar bonito. Ele rola na lateral direita para Carlos Alberto,que dá uma olhada pra trás, vê Lima e Ramos Delgado e decide sair tabelando com Clodoado.

Clodoaldo acha Edu, que depois de entortar o lateral direito triangula com Ailton Lira e Pita.

Pita, levanta a cabeça, vê Nilton Batata se mandando pela direita, João Paulo se mandando pela esquerda, mas prefere enfiar a bola para Chulapa. Um passe de trinta metros, espetacular, que o camisa 9 mata o peito e escora para Zé Sérgio. Mais um drible no lateral direito e o Santos recomeça o jogo no meio campo. (A tal da posse de bola é fundamental nesses tempos modernos.)

Quem recebe é Carlinhos. Ele, Renato e Giovanni, triangulam aguardando a aproximação de Diego. Alex dá a segurança defensiva com Ramos Delgado e Rodolfo Rodriguez, que dá um grito e pede que os gols comecem logo.

E foi atendido.

Diego aciona Ganso que num passe milimétrico faz a bola chegar ao pés de Robinho. Oito pedaladas e o passe para Neymar. Chapéu, elástico, drible da vaca, bola no meio das pernas, três danças depois ele chega a linha de fundo e cruza. A torcida na Vila Belmiro reclama de muita firula e não entende o cruzamento. Entenderiam.

No momento do cruzamento, o tempo parou. Como naquelas imagens de cinema, onde tudo começa a andar em câmera lenta.

Estende-se o tapete vermelho no gramado da Vila. Os adversários prostram-se. Do vestiário da Vila, sai uma camisa 10. Branca, imaculada, com aura celestial. Vestido com ela, um negro, caminha em direção a grande área. A bola o espera. A bola sempre o esperou, a bola sempre o aguardou. A bola, esperta, sabia quem melhor cuidava dela, quem era o grande amor da vida dela e vice-versa.

E aquele negro, com a camisa 10, chegou na bola. E o tempo voltou a andar.

Pelé, como num passe de mágica, matou a bola no peito. Um zagueiro tentou desarmá-lo, tomou um chapéu. Outro tentou bater nele, tomou uma bola no meio das pernas. O goleiro saiu, foi driblado. E Pelé, empurrou a bola para as redes, marcando o gol do Santos.

A torcida festeja, Lula, do banco, sorri. Leão pede mais.

A bola volta para o meio campo, e o jogo prossegue. Acaba 11x0.
Poderia ser mais, se o bandeirinha não tivesse anulado três gols legítimos.
Na súmula, 40 jogadores em campo.

O adversário, reclama. Diz que esses meninos são muito abusados, que querem ver no dia que o jogo valer alguma coisa, que na volta vai ter pontapé.
Surge um boato entre os repórteres, que Pelé já está vendido para Europa. Coutinho sai reclamando que o bandeirinha o perseguiu, que se as jogadas fossem do Pelé não seriam anuladas.
Neymar e Robinho dançam enquanto Chulapa comanda o samba. Pepe auxilia um adversário, que saiu do jogo após receber uma bolada em uma cobrança de falta.
Pelé autografa camisas de adversários, de torcedores, de jornalistas, de curiosos.
Zito chama todo mundo. Fazem a oração, pede outro jogo desses e diz que quer a taça.

No vestiário, Lula, sorrindo, conversa sobre os cuidados no próximo jogo. Perguntaram se ele ia para uma tal de coletiva. Ele diz que não, que prefere o convívio dos vestiários e atletas. Fica na resenha com Leão, que alerta sobre a folga desses moleques. Athiê vem, com uma mala, pagar o bicho dos jogadores.

E do céu, Deus volta a dar atenção para o mundo.
Por noventa minutos, ele também quis ver lá de cima a essência desse tal de futebol. E voltou para cuidar do mundo feliz, orgulhoso de uma das suas criações.
São Paulo e São Jorge olham e estranham. Aquela roupa que Deus vestia, antes, branca, agora tem um número 10 às costas e um símbolo em branco e preto do lado esquerdo do peito, estranham o corte de cabelo, um negócio esquisito, tal de moicano. Cai a ficha.
Eles resmungam, porque Deus dá valor em demasia a esse tal de futebol arte e não dê o mesmo valor a posse de bola, a torcida, ao resultado. Imploram para que ele não mande outro raio para aquele mesmo estádio.

E Deus, com um sorriso no rosto, lhes diz “escapou enquanto eu dei um soco no ar comemorando o primeiro gol”.

E Deus, pede que todos sigam com a vida. Apenas sugere que, pelos próximos cem anos, se gostarem mesmo de futebol, parem tudo o que estiverem fazendo para assistir o próximo show desse time de branco. Mesmo que não torçam pra ele.

Nenhum comentário: